Nos Eua, Redefinição das Fronteiras entre o Estado e o Catolicismo
À direita na foto: Paul Ryan, candidato a vicepresidente apresentado por Mitt Romney (à esquerda)
Mitt Romney, o candidato presidencial do Partido Republicano, escolheu há dias como candidatto a vice-presidente o congressista Paul Ryan, autor do «House Republican Budget», um projeto orçamental conjunto que permite articular a ação dos congressistas republicanos nos diversos comités do Congresso. É também um católico conhecido e declarado.
Romney, ele próprio um homem religioso – foi responsável da Igreja Mormon – parece ter seguido o conselho que lhe foi dado por Ralph Reed, fundador e presidente da Faith and Freedom Coalition (Coligação fé e liberdade) quando o também católico Rick Santorum foi afastado da corrida à candidatura republicana: «devia escolher um candidato [a vicepresidente] capaz de mobilizar os evangélicos, os católicos romanos fiéis e os conservadores».
Ayn Rand, uma filósofa social hiperliberal
O adjetivo «fiel» aplicado a «católico romano» significa que Ryan não representa, e por certo não mobilizará os católicos «não fiéis», os católicos solidaristas: Ryan é um católico defensor do individualismo, do capitalismo neoliberal; a sua filosofia social é a de Ayn Rand, uma exilada russa, fundadora do «Objetivismo», que considera o egoísmo uma virtude ou pelo menos faz a apologia do capitalismo não regulado e defende uma visão racionalista do homem e da organização social; quase desconhecida na Europa, Rand tem prestígio nos Eua: Alan Greenspan, o já mítico responsável do banco central norte-americano, o Fed, era um dos seus discípulos.
Em abril passado, Ryan fez aprovar cortes nos orçamentos sociais e invocou para isso o seu catolicismo. Vários bispos escreveram ao Congresso que Ryan «não conseguira cumprir» os critérios morais do catolicismo. Nessa altura um grupo de jesuítas e outros professores da Universidade Georgetown escreveram a Ryan: «O seu orçamento parece refletir os valores da sua filósofa favorita, Ayn Rand, de preferência aos do evangelho de Jesus Cristo. O apelo dela ao egoismo e o seu antagonismo face à religião são contrários aos valores evangélicos de compaixão e amor». Por isso, é legítimo supor que Ryan representará a minoria do catolicismo americano. Por tradição, a maioria dos católicos dos Eua vota no Partido Democrático.
Desde a década Ronal Reagan, os anos 1980, o catolicismo dos Estados Unidos aparece dividido face ao Estado entre uma ala nova e minoritária, o catolicismo individualista no terreno político – um pouco como a Communione e Liberazione em Itália –, votando nos republicanos, e uma corrente maioritária e tradicional, a do catolicismo solidarista, que continua a votar nos democráticos. São dois tipos opostos de fronteira entre o catolicismo e o Estado. Joe Biden, o atual vicepresidente dos Estados Unidos, é uma personificação do catolicismo solidarista. A oposição não podia ser mais visível. E pela primeira vez nos Eua, são católicos tanto o vicepresidente em funções como o candidato oposicionista a vicepresidente .
Um outro elemento acrescenta drama a este combate de duas conceções antagónicas do Estado mas ambas católicas : quando há meses o Vaticano criticou as freiras norte-americanas, acusou-as de serem demasiado solidaristas (para simplificar). Por outro lado, os bispos católicos americanos, solidaristas embora, estão ao ataque a Obama. Preparam-se novidades na definição das fronteiras entre o catolicismo e o Estado nos Eua.